Postigo Cerrado – um
magnífico romance sobre a ausência
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Vítor da Rocha - Um
escritor que nos põe a pensar
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Em Postigo Cerrado, Vítor da Rocha fala-nos do abandono a que
tem sido votado, desde há décadas, o interior do país.
Pelo tombar do dia 9 deste mês de Janeiro, sexta-feira, dei por mim a pingar, à lareira, memórias da aldeia, da minha aldeia, e da sua gente – a minha gente. Fui desfazendo nós, de cabeça, em busca de instantes de felicidade. Lá fora nevava. Muito. Um nevão digno de ser adorado. Olhei a fogueira com um sorriso morno e, - Está uma noite de mais reler que ler. fui pastar os olhos por uma das estantes dos meus afectos. O Vítor da Rocha – um rapaz da minha idade que nasceu em Carviçais, Torre de Moncorvo – sorriu-me, um sorriso algo tímido, e, zás, saltou-me para o colo. Não para o colo. Para as mãos. Convenhamos, quem me saltou para as mãos, e não para o colo, foi o romance «Postigo Cerrado» de Vítor da Rocha. O romance «Postigo Cerrado» foi-me oferecido pelo autor, Vítor da Rocha, em 18 de Outubro de 2003. Sei que, então, o li com a mesma sofreguidão com que se come a alheira, aconchegada por uns copos de tinto, em casa dos pais quando, por estes dias frios de Inverno, os visitamos. Sei o que acabo de escrever porque tenho por costume escrevinhar, a lápis, impressões de leitura nas páginas dos livros que, por uma razão ou outra, me mordem as emoções. Lá fora, os deuses peneiravam pétalas de silêncio, pétalas brancas e geladas, sobre o chão da noite. Comecei por reler a síntese que vem impressa na contracapa: «Na aldeia serrana só uma menina ainda vai à escola, descendo por caminhos de cabras para apanhar a camioneta da carreira. O seu pai é o derradeiro pastor que sonha com uma estrada por onde regressem os que abandonaram a terra. E que afunde as razões do leiteiro para lhe baixar os preços do leito produzido pelas suas ovelhas. E é Ti Fontes, o presidente da Junta, que paga pelas culpas do Governo. No fim, os cães olham à sua volta e vêem-se sem donos. E regressam às origens, galgando montes e assustando velhas. Selvagens como os homens que deixam morrer metade do seu país.» Saboroso aperitivo, hem? Reli o livro nessa noite e na noite seguinte. Horas de felicidade. Uma vez por outra parava, o livro aberto entre as mãos, e, de olhos fechados, revia estórias da minha meninice e adolescência. Estórias muito parecidas com as estórias que este «Postigo Cerrado» de Vítor da Rocha nos conta. «Truz, truz, cai uma mão com força em cima das tábuas enrugadas da porta, ao fundo das escadas, renasce-lhe a esperança de que a visita tenha a sua direcção, talvez seja o filho arribando sorrateiro pela vergonha da culpa, tão sorrateiro que não o pressentiu o coração sábio da velha, que está ainda a arredar o banco para trás de modo a poder levantar-se quando novo truz, truz sobe pelas escadas, Tia Adelina, ande depressa…» As pouco mais de duzentas páginas deste romance são retratos falados que nos magoam, devagarinho, e, algumas vezes, nos açoitam, devagarinho, mas são, de igual modo, afagos, carne da nossa carne, sangue do nosso sangue, carne e sangue de gente esquecida. Porque a esquecemos. Nós. | ||
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quinta-feira, 13 de dezembro de 2012
Mais um escritor de Carviçais (Torre de Moncorvo), que também estudou comigo. O livro que aqui vos apresento, comentado pelo Jorge Laiginhas no Diário de Trás-os-Montes, só é possível de encontrar nos alfarrabistas. O Círculo de Leitores deve-nos uma reedição.