Costuma-se
dizer que se Maomé não vai à montanha vai a montanha a Maomé. No centro
do novo romance de Afonso Cruz está precisamente este aforismo. Há uma
idosa alentejana cujo maior desejo é visitar a Terra Santa. Como a neta
não a pode levar lá, é engendrada uma forma de trazer Jerusalém até ao
Alentejo. É aqui que reside o aspeto cómico de um romance que se revela
no entanto uma tragicomédia.
«É
certo e sabido» - lê-se num dos últimos parágrafos - «que o final feliz
é uma invenção humana, uma necessidade de obliterar a morte. A vida
nunca acaba bem». No caso da vida de Rosa - a personagem principal, neta
da tal idosa que queria ir a Jerusalém - a infância também já não foi
auspiciosa. Viu o avô atirar-se a um poço, o pai enforcar-se e a mãe
fugir de casa.
Cobiçada pelo olhar lúbrico dos homens, Rosa há-de
descobrir no professor Borja um cúmplice, primeiro, e depois o objeto da
sua trágica dádiva.
É o professor Borja, um erudito sem audiência
nem reconhecimento, que há de preparar o cenário da falsa Jerusalém.
Exigindo no entanto a fidelidade a detalhes importantes: entre eles, o
facto de Jesus Cristo beber cerveja e não vinho.
Não se trata de
uma liberdade ficcional mas de um aspeto que tem sido discutido pela
História. O professor Borja é taxativo: «O que se bebia no espaço
geográfico em que Cristo habitava era cerveja. O vinho era uma bebida de
romanos, dos invasores. Cristo não iria beber a bebida dos ricos, dos
opressores».
Prémios Time Out Lisboa 2012 - Livro do Ano
Edição/reimpressão: 2012
Páginas: 248
Editor: Alfaguara Portugal